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Poeshydra

Atualizado: 21 de jun. de 2022

Três poemas de Alessandro Padin



A HORA SELVAGEM


Passei o dia a revisar cada mensagem

Um mínimo sinal, um eco, sussurro

No quarto que em manhã sem sol, escuro

Não guarda nem o cheiro, aroma, imagem


As mãos frias a tocar a hora selvagem

Que arranca azeda e crua o breve futuro

Que vil destrata a fé como casmurro

A erguer torto troféu em brusca passagem


Silêncio e o soprar do vento oeste

A flor branca a crescer rente a janela

O lenço que ao vestir morno reveste


Capricho que essa hora aguda enleva

O cair e levantar, o eterno teste

A luz que mora só em brilhante estrela

 

QUE VOLTE O MENINO


Não são raras as vezes que, com medo

O menino solta as mãos e foge do mar

Correndo assustado pela areia fofa da praia

Na direção contrária, para os braços frios

Da urbe que não o quer doce e terno


E quem o conduz, resignado, pensa

- Tudo ao seu tempo, não perca a esperança


Tantos sóis e luas ainda vão girar este mundão

Tantas nuvens vão desenhar corações

Enquanto você, menino, tapa os ouvidos

Para não ouvir os gritos dessa gente insana

No vai e vem das vontades que é só o vazio


E o condutor, fechando os olhos e sorrindo

Respirando a maresia que vem do oceano

Juntando as mãos na sussurrante oração

Só quer que nada de mal lhe aconteça

Só quer que ele volte, que volte o menino

 

BAILE INTERROMPIDO


O navio e os seus vapores quando somem no horizonte

Testemunham o momento, aquele estalo rompendo os laços delicados

De um coração partido que salta do peito do marujo em terra firme


E o que resta é melodia que se apaga do baile interrompido

A lágrima contida no rosto barbado que não aprendeu a ser fraco

O abraço não dado na noite quente de lua em quarto minguante


Qual é, marujo? Não saber perder?


Se a culpa te corrói a alma pela palavra cuspida de sobressalto

É porque você nunca percebeu quanto machuca um poema cortante

O arrepiar de um sopro no ouvido que você nunca chegou perto


Agora as saias avançam o oceano em outro bailado que não o seu

O sorriso, o batom rubro a besuntar a face de algum estrangeiro

A gargalhada a ecoar pela escotilha roubando sua madrugada.


Qual é, marujo? Não saber perder?



Alessandro José Padin Ferreira é poeta, professor universitário e jornalista. Após anos dedicados à atividade jornalística e acadêmica, retomou os estudos em linguagens poéticas, vem participando de antologias e prepara o seu primeiro livro, "O Idílio Latino", que será editado pela Editora Ateliê de Palavras.

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