Três poemas de Alessandro Padin
A HORA SELVAGEM
Passei o dia a revisar cada mensagem
Um mínimo sinal, um eco, sussurro
No quarto que em manhã sem sol, escuro
Não guarda nem o cheiro, aroma, imagem
As mãos frias a tocar a hora selvagem
Que arranca azeda e crua o breve futuro
Que vil destrata a fé como casmurro
A erguer torto troféu em brusca passagem
Silêncio e o soprar do vento oeste
A flor branca a crescer rente a janela
O lenço que ao vestir morno reveste
Capricho que essa hora aguda enleva
O cair e levantar, o eterno teste
A luz que mora só em brilhante estrela
QUE VOLTE O MENINO
Não são raras as vezes que, com medo
O menino solta as mãos e foge do mar
Correndo assustado pela areia fofa da praia
Na direção contrária, para os braços frios
Da urbe que não o quer doce e terno
E quem o conduz, resignado, pensa
- Tudo ao seu tempo, não perca a esperança
Tantos sóis e luas ainda vão girar este mundão
Tantas nuvens vão desenhar corações
Enquanto você, menino, tapa os ouvidos
Para não ouvir os gritos dessa gente insana
No vai e vem das vontades que é só o vazio
E o condutor, fechando os olhos e sorrindo
Respirando a maresia que vem do oceano
Juntando as mãos na sussurrante oração
Só quer que nada de mal lhe aconteça
Só quer que ele volte, que volte o menino
BAILE INTERROMPIDO
O navio e os seus vapores quando somem no horizonte
Testemunham o momento, aquele estalo rompendo os laços delicados
De um coração partido que salta do peito do marujo em terra firme
E o que resta é melodia que se apaga do baile interrompido
A lágrima contida no rosto barbado que não aprendeu a ser fraco
O abraço não dado na noite quente de lua em quarto minguante
Qual é, marujo? Não saber perder?
Se a culpa te corrói a alma pela palavra cuspida de sobressalto
É porque você nunca percebeu quanto machuca um poema cortante
O arrepiar de um sopro no ouvido que você nunca chegou perto
Agora as saias avançam o oceano em outro bailado que não o seu
O sorriso, o batom rubro a besuntar a face de algum estrangeiro
A gargalhada a ecoar pela escotilha roubando sua madrugada.
Qual é, marujo? Não saber perder?
Alessandro José Padin Ferreira é poeta, professor universitário e jornalista. Após anos dedicados à atividade jornalística e acadêmica, retomou os estudos em linguagens poéticas, vem participando de antologias e prepara o seu primeiro livro, "O Idílio Latino", que será editado pela Editora Ateliê de Palavras.
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