Por paulodetarso
Entre os assuntos atuais, sem sombra de dúvida, o racismo surge como um dos top ten em qualquer lista que se faça. E o assunto é de vital importância para a sociedade. O racismo é uma doença, ninguém nasce racista, torna-se racista. Somos inoculados por pais, avós, tios, escola, amigos, grupos, empresas etc., e, mais do que nunca, é preciso extirpar este mal da sociedade.
Nesta série de artigos sobre filmes ruins, meus possíveis e raros leitores já devem ter notado dois filmes aqui comentados, “The Thing With Two Heads” - O Monstro de Duas Cabeças - de 1972, dirigido por Lee Frost, e “Watermelon Man” de 1970 - A Noite em que o Sol Brilhou - (aguarde o próximo post sobre nomes de filmes!!!), de Melvin Van Peebles, tocam no assunto.
Os dois filmes lidam, ou lidaram, com o assunto e talvez não poderiam ser realizados hoje. O assunto precisa de tato para não ferir susceptibilidades.
No primeiro filme, um cientista com uma doença terminal estuda a forma de fazer transplantes de cabeças para conseguir se salvar. A ideia é encontrar um doador, e depois que a experiência desse certo a cabeça doente seria eliminada. O problema começa quando o único doador surge: é um presidiário negro no corredor da morte. Acontece que o cientista é extremamente racista, e a partir dai a história desanda como qualquer bom filme ruim.
O filme tem uma série de diálogos hilariantes sobre preferencias e gostos de cada uma das cabeças. O ator Ray Milland é uma sempre memorável figura quando se trata de “trash movies”, sempre estrelando verdadeiras joias, tais como Obsessão Macabra (1962), Pânico no Ano Zero (1962), O Homem dos Olhos de Raio-X (1963), A Invasão das Rãs (1972) e Galáctica – Astronave de Combate (1978), entre outras.
O segundo filme é Watermelon Man, em que um branco arrogante se vê da noite para o dia (sem trocadilhos aqui!) convertido em um negro. As consequências são imagináveis, a sua mulher e filhos sofrendo com a transformação. Todo o processo para que brancos possam sentir por uns momentos o que é ser negro.
O filme se utiliza de uma das coisas mais detestáveis na arte de interpretação, hoje em dia, chamada de Black Face, quando brancos se maquiavam de negros para atuar (artistas famosos já fizeram isto nos anos 30, Spencer Tracy, A Nave de Satã (O Inferno de Dante), de 1935) só que aqui de forma invertida onde um negro, o artista Godfrey Cambridge, interpreta Jeff Gerber, um branco. A transformação gera inúmeros e previsíveis problemas para o intérprete. Ele sempre aposta corrida com o ônibus que o leva para o trabalho e, a partir da sua transformação, a polícia o persegue, achando que é um ladrão (algo parecido por aqui???); os vizinhos pedem sua mudança para não desvalorizar as casas ao lado.
O notável destes filmes é, em que pese a má interpretação, os roteiros descuidados, e as falhas de continuidade, que eles abordam e apresentam um retrato caricaturado da sociedade, onde tanto negros e brancos são criticados por suas posições.
Algo que, hoje, é preciso ser olhado com o devido cuidado.
Há um outro filme que não cai na classificação de filmes ruins, mas que também aborda a questão de forma muito séria, ainda que tenha toques de comédia, que é “Adivinhem Quem Vem para o Jantar (Guess Who's Coming to Dinner' de Stanley Kramer, filem de 1967) com Sidney Pontier. Ele um famoso médico, começa um romance com uma branca e ela prepara uma surpresa para sua família, não avisando que ele é negro.
Para quem era criança nos anos 60 e 70, esses filmes entram no imaginário e acabam por ajudar na formação, mostrando o quão ridículo o racismo pode ser.
Nós, sem nenhuma exceção, somos afrodescendentes e somos fruto da mistura, e não da pretensa pureza de raça[1], o que nos permitia enfrentar e vencer as diversidades do ambiente.
[1] Os zoólogos geralmente consideram a raça um sinónimo das subespécies, caracterizada pela comprovada existência de linhagens distintas dentro das espécies, portanto, para a delimitação de subespécies ou raças a diferenciação genética é uma condição essencial, ainda que não suficiente. Na espécie Homo sapiens - a espécie humana - a variabilidade genética representa 3 a 5% da variabilidade total, nos sub-grupos continentais, o que caracteriza, definitivamente, a ausência de diferenciação genética. Portanto, inexistem raças humanas do ponto de vista biológico (grifo nosso).
Mais aqui: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ra%C3%A7a#:~:text=O%20conceito%20de%20ra%C3%A7as%20humanas%20foi%20usado%20pelos%20regimes%20coloniais,proteger%20os%20direitos%20das%20minorias.
paulodetarso é arquiteto, artista plástico, artista gráfico e doutorando em artes visuais.
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